quinta-feira, 29 de março de 2012

Recuperar a gargalhada

Célia Gil

Resultado de imagem para gargalhada criança
(imagem do google)
Onde está a gargalhada genuína
da criança que fui um dia?
Quando foi que o sorriso deixou
de se delinear nos meus lábios?
Não sei ao certo,
mas foi há muito,
há tanto tempo
que nem me recordo bem…
Esse sorriso é hoje imagem difusa,
tela de contornos envelhecidos,
memórias perdidas no tempo…
Mas tenho saudades
do tempo em que a minha alma
tinha razões para sorrir,
em que os meus olhos
tinham o brilho das gargalhadas,
em que todo o meu rosto
era um reflexo de alegria.
Quem me dera que a mágoa
fosse como as palavras,
que a pudesse apagar…
Mas ela entra,
apodera-se de nós
e vem para ficar
escrita na linha da vida
a tinta permanente.

Há que boicotar a mágoa,
apagá-la definitivamente
e procurar o sorriso perdido.
Só assim a gargalhada
voltará a desenhar no rosto
a paz e a felicidade perdidas.
Quem sabe, quem sabe…
                               Célia Gil

segunda-feira, 26 de março de 2012

Aliteração da borboleta

Célia Gil

(imagem do google)

Suave, solta, sinuosa,
a borboleta bamboleia-se
em celestiais céus cinza.
Soltas asas desenvoltas
contornam canteiros,
refrescam-se em frescas flores,
toque de tule translúcido
que roça rente ao rosto
iluminando a alma leve,
bela borboleta breve…
                               Célia Gil


sábado, 24 de março de 2012

Sonhos (con)sentidos

Célia Gil
Resultado de imagem para sonhos

(imagem do google)


Não me digas quem devo ser,
qual o melhor caminho a seguir,
como sou quero permanecer,
pronta a sonhar, a me iludir.

Não me digas que não acredite,
que não ouça o que quero ouvir,
que não me entregue, não me dedique
e que não tenho razões para sorrir.

Por que ousas desmoronar
os castelos que sempre erigi?
Como ousas destronar
os sentimentos que eu ergui?

Ante tuas feras realidades
tapo fortemente os meus ouvidos
ignoro de todo essas verdades
e sigo o que me dizem os meus sentidos.
                                                  Célia Gil

quinta-feira, 22 de março de 2012

O enterro do "a"

Célia Gil

(imagem do google)

Em certo momento um feiticeiro
fez com que o "a" se dissolvesse
e tudo ficou escuro, feio e frio.
O i sentou-se no pódio,
fez-se rei do mundo
e deixou-o misterioso e sombrio.
Fino, libertino, invencível,
enterrou o "a" num sítio fundo,
longe de tudo, um sítio perecível.
Logo o u se lhe juntou,
os dois fortes e invencíveis,
ciumentos, funestos,
fúnebres sentimentos difundindo.
E os seres, efémeros,
feridos bem no fundo do seu íntimo,
mortos os bons sentimentos,
sucumbem por vírus mortíferos.
                                            Célia Gil

(uma brincadeira com o "a" como letra proibida)

segunda-feira, 19 de março de 2012

Pai

Célia Gil

Onde quer que estejas, pai, sei que me vês, sei que me sorris e guias a minha vida. Aqui deixo os poemas que te escrevi quando adoeceste. Partiste tão jovem, com apenas 49 anos, tendo eu 23 e sinto-o sempre como se fosse hoje.
 

(imagens do google)

Teus olhos tão cansados de existir
poisam nos meus com ternura e carinho,
e na vã aparência de um sorrir,
sofres teus pesadelos tão sozinho!

Uma tragédia desola teu peito,
sonhos, ilusões morrem no teu rosto.
Também é meu esse sonho desfeito.
Também é meu todo o teu desgosto!

Pensa que não estás só, eu estou contigo!
Se quiseres chora em meu colo amigo,
de resto,  incapaz  ante o teu sofrer.

Se pudesse, ouve, tudo faria,
Contigo teu sonho construiria
Assim, só te resta o meu bem-querer!
                                                    Célia Gil
 

Quero gritar ao mundo a minha dor
para assim  aliviar esta tensão,
derramar lágrimas de dissabor
que andam perdidas no meu coração!

Queria ser como Asclépio, feiticeira,
para poder recuperar a vida
e dá-la a quem por ela em vão suplica,
a quem se sente sem eira nem beira.

Assim, resta-me apenas a esperança
ainda que ténue, ainda que vaga,
de poder beijar tua face branca,

ainda que por segundos de angustia.
Erguer os meus grous e flores de astúcia
e libertar-te de tão triste saga.
                                                             Célia Gil
 

É tão doloroso viver sem ti!
No meu peito sinto, apertado, um nó,
e quantas lágrimas por ti verti?!
Agora, meu querido, estou tão só!

Se recordo o passado em que te tinha,
vislumbro a tua imagem já cansada,
a tua dor que também foi minha,
a tua face tão amargurada...

Ah!, poder eu tirar-te à morte fria,
E nos meus braços aquecer teu ser.
Dar vida ao teu corpo que ali jazia,
sangue para em tuas veias correr.

E poder falar-te, acarinhar-te,
contar-te a minha vida, o mundo duro.
Ver-te sorrir, e, sem dores, ouvir-te
dar-me conselhos úteis para o futuro!
                                                    Célia Gil
                                                          

Se, sem dó, me levaste meu pai querido,
leva minh'alma que se t'oferece
Nada em mim mais vive! Só agradece
que recolhas meu ser enlouquecido!

Dói em meu peito o peso das saudades.
Lágrimas de um profundo sentimento,
são vestígios de cruel sofrimento.
É um viver de inúteis ansiedades.

a quem darei o Amor que por Ti sinto?
A minha mão já não aquece a tua,
minhas lágrimas não fazem viver

teu ser por quem sinto carinho infindo.
O meu olhar e minha face nua,
anseia tanto ver-te renascer !
                                                          1993
                                                    Célia Gil



domingo, 18 de março de 2012

Dúvidas existenciais

Célia Gil
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(imagem do google)



Nem sempre é fácil entender
tudo o que digo,
especialmente o que fica por dizer,
porque o que sou,
o caminho que sigo,
nem eu o chego a perceber.
O enigma do eu que me habita
será sempre uma interrogação
a pontuar-me a vida,
a questionar-me em vão.
E quem poderá afirmar
com toda a convicção
que o caminho a trilhar
está apenas na sua mão?
Tudo é incerto, até mesmo eu.
Tudo é mistério, muito mais a vida.
Tudo é incógnita, inclusive o céu.
Tudo é inesperado, até a despedida.
Se o que sou é uma linha insegura
delineada na folha em branco,
o futuro é uma névoa obscura
e o passado a prisão do desencanto.
E se para me encontrar,
tenho de sair de mim,
é a caneta que me irá guiar
nessa busca sem fim.
                               Célia Gil

sexta-feira, 16 de março de 2012

Irmã que nunca tive

Célia Gil

(imagem do google)


Hoje preciso desabafar contigo,
irmã que nunca tive.
Quero pegar-te na mão,
contar-te como me sinto.
E tu, irmã sonhada,
ficarás acordada
apenas para me ouvir.
Ouvir-me-ás pacientemente,
sorrir-me-ás docemente,
saberás exactamente o que sinto.
Riremos juntas
dos momentos que não tivemos,
partilharemos juntas
os momentos que não vivemos.
E eu nunca mais estarei só.
Já velhinhas,
continuaremos unidas
em histórias fingidas,
por nós ficcionadas,
irmãs, amigas, conhecidas!

                                Célia Gil

segunda-feira, 5 de março de 2012

Abomino vazios

Célia Gil
Imagem relacionada
(imagem do google)
Há vazios que nos invadem,
nos preenchem de tal maneira,
que nos perdemos neles.
E quando queremos sair
estamos enlaçados e abraçados por eles,
numa prisão de sentimentos ausentes.
Abomino vazios…
Quero-me grávida de sentimentos e emoções,
sempre prontos a nascer a qualquer momento.
O que quer que seja será sempre melhor,
porque será vida…vitalidade...
Abomino vazios
que nos fazem perder momentos
esquecer quem somos
ignorar para onde caminhamos
e nos invadem, tomando-nos nos braços
preenchendo a mente, esmagando o ser…
Prefiro a consciência, ainda que dura e cruel
a essa prostração improfícua,
a essa antecipação da morte.
Quero viver!
Quero sentir
os músculos, as veias, o sangue,
a lágrima quente, o sorriso espontâneo,
a fome, a sede, a náusea, o desejo…
cada ínfimo acontecimento como se fosse o último…
Quero existir!
                       Célia Gil

sexta-feira, 2 de março de 2012

Oceanos recônditos

Célia Gil

(imagem do google)

Os meus olhos moram em profundezas,
nas águas límpidas dos oceanos
e abarcam corais e peixes de todas as cores.
E no mais fundo dos oceanos
moram os meus medos, as minhas incertezas,
escondem-se os meus secretos pavores.
Mas é nessas profundezas
que estão também sonhos guardados,
ilusões delineadas no infinito
em contornos de delicadezas,
sonhos ainda não concretizados
ilusões marcadas em granito
nas rochas dessas profundezas.
                                              Célia Gil

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