quinta-feira, 22 de julho de 2010

Crenças populares

Célia Gil
(imagem do Google)

      A explicação para certos acontecimentos ou fenómenos dada pela sabedoria popular é, sem dúvida, fascinante. Sempre gostei de ouvir as minhas avós contarem histórias fantásticas da sua aldeia. Sons que se ouviam em sótãos antigos, gavetas que se abriam sem explicação aparente, eram vistos como chamadas de entes mortos, um pedido de ajuda destes, que necessitavam de uma oração. Só perante orações os sons se dissipavam. E o que para mim parece tão aterrador quanto curioso, para estas pessoas fazia parte do seu dia-a-dia, da casa, dos sons da casa. Ao invés de medo, sentiam que era perfeitamente natural, fazendo parte das suas vidas. O que para mim pareceria som de ratos eram mensagens dos mortos, das almas penadas, em busca de auxílio.
      E o olhar? Desde tempos remotos que o olhar era dotado de um poder mágico, instrumento de pensamentos interiores. Segundo crenças populares, falar de mau-olhado significava que o observador lançava um olhar maléfico ao observado. Este podia ser alguém ou algo. Explicavam-no como pertencente a alguém com um dom, alguém que, com o olhar, seria capaz de se vingar, matar, seduzir. Motivos? Amores não retribuídos, bens materiais cobiçados (especialmente terras de cultivo muito produtivas e animais de criação, que crescessem depressa e viçosos). Este olhar, segundo dizem, tinha o poder de fazer mirrar os legumes plantados, secar cultivos, adoecer animais. Talvez uma forma que encontravam para explicar fenómenos incompreensíveis, doenças e mortes súbitas inexplicáveis.
      Também a Lua, segundo o que me dizem as minhas avós, merecia um certo respeito por parte do homem, simbolizando conhecimento, fecundidade, fertilidade, auxiliando o homem nas colheitas, já que as fases lunares influenciavam nos acontecimentos terrenos. Acreditava-se que a lua cheia podia provocar loucura. A lua nova simbolizaria fecundidade, cura de doenças, casamento, amor. No quarto minguante, tudo o que fosse podado não cresceria, representando um momento aziago para a realização de casamentos ou nascimento de uma criança. Seria, no entanto, um excelente momento para mudar de casa e para semear o feijoeiro trepador e as ervilhas. A maioria das pessoas acreditava que as plantas e sementes se deviam deitar na terra no quarto crescente, havendo mais probabilidades de êxito. Na lua velha semeavam-se as cebolas e as flores. Estas são apenas algumas das crenças de que se lembram as minhas avós. A estas se juntarão, com certeza, muitas outras igualmente interessantes.
      A par das fases da lua surgiam provérbios, relativos aos meses do ano, que explicavam também fases de sementeira ou serviam de boletim meteorológico. Em Janeiro espiga o nabeiro / Janeiro tem uma hora por inteiro/ Se queres ser bom milhareiro, faz o alqueve em Janeiro/ Os bons dias em Janeiro vêm-se a pagar em Fevereiro/ Janeiro quente traz o diabo no ventre; Em Fevereiro ribeiro cheio/ Fevereiro enganou a mãe ao soalheiro/ Quando não chove em Fevereiro, nem bom centeio nem bom lameiro; Em Março, tanto durmo como faço/ Março marçagão, de manhã Inverno, à noite Verão/ Quem não poda até Março, vindima no regaço/ Nasce a erva em Março ainda que lhe dêem com um maço/ Vento de Março, chuva de Abril, fazem Maio florir/ Março ventoso, Abril chuvoso e Maio amoroso, fazem o ano formoso; Em Abril águas mil / Em Abril ainda a velha queima o carro e o carril e uma canga que ficou em Maio a queimou/ Uma água de Maio e três de Abril valem por mil; Em Junho, foice em punho/ Junho calmoso, ano formoso/ Junho floreiro, paraíso verdadeiro/ Lavra por S. João, se queres haver pão; em Julho ceifo o trigo e o debulho, e em vento soprando o vou limpando/ Água de Julho, no rio não faz barulho/ Por muito que queira o Julho ser, pouco há-de chover; Em Agosto cada dia com seu rosto/ Chuva de Agosto apressa o mosto/ Em Agosto secam os montes, em Setembro as fontes; Em Setembro, planta, colhe e cava, que é mês para tudo/ Setembro molhado, figo estragado/ Lua nova setembrina, sete luas domina; Em Outubro sê prudente: guarda o grão, guarda a semente/ Logo que Outubro venha, procura logo lenha/ Outubro quente traz o diabo no ventre/ Outubro meio chuvoso, torna o lavrador venturoso; Tudo em Novembro guardado: ou em casa, ou enterrado/ Novembro à porta, geada na horta; Em Dezembro descansar, para em Janeiro trabalhar/ Ande o frio por onde andar, no Natal cá vem parar.
      Crenças ou superstições, por elas se rege o povo e se cria a cultura popular, que não deve ser, de modo algum, desconsiderada, pois faz parte de uma sabedoria de há séculos. Maravilho-me perante esta sabedoria que ultrapassa toda a livresca que eu possa ter adquirido com os estudos ou ao longo da vida. Os nossos antepassados são um poço de riqueza, são a origem da nossa cultura, a urze da nossa civilização, por isso ouso fazer um pedido: não menosprezem as crenças, não riam das superstições, antes tentem entender o que esteve na sua origem e aproveitem a riqueza que os vossos antepassados ainda vos podem transmitir. De histórias que se contam, igualmente interessantes e surpreendentes, falarei numa próxima oportunidade.
                                                                                             Célia Gil

o tempo

Célia Gil
(imagem do Google)

   «O tempo voa», ouvia eu dizer aos mais velhos e eu, nos meus dez anos, considerava que os «velhos» eram muito pessimistas, porque o tempo parecia não passar. Há, de facto, uma época da nossa vida em que parece termos tempo para tudo e ainda sobra tempo e esse tempo que se interpõe entre a infância e adolescência e a idade adulta parece uma eternidade. Nunca mais chega o tempo de nos tornarmos independentes, de vivermos a nossa vida, sem que ninguém dê ordens ou sequer opine.
    Depois, esse tempo passa...
    E, quando chegamos à idade adulta, damos por nós a pedir ao tempo que nos dê mais tempo, porque este nunca chega para nada. É sempre pouco para milhares de afazeres que temos. É sempre insuficiente para toda as tarefas que temos de realizar. Então e o tempo para descansar, relaxar, usufruir, viajar...O  tempo para nós próprios? Esse fica sempre para segundo plano e só existe se houver, e facto, tempo. O tempo para nós termina quando começa o tempo de trabalhar, de cuidar da casa, de educar e dar atenção aos filhos. Só então compreendemos o que nos diziam os mais velhos na infância. Realmente, "o tempo voa", "passa a correr". E quantas vezes desejámos interiormente que as horas esticassem e não chegasse a hora de ir dormir sem metade do que tínhamos estipulado para esse dia por fazer?
   Daí o tempo ser tão precioso. Nunca temos tempo para pensar sequer na sua importância e dar-lhe o seu verdadeiro valor.
   Passemos a viver todos os segundos da nossa vida como se fossem os últimos!
                                                                                                                                Célia Gil

quinta-feira, 15 de julho de 2010

Palavras

Célia Gil
(imagem do Google)

As palavras são reveladoras,
sinais do tempo,
marcas do passado,
sonhos futuros,
premonições,
angústias,
tormentos,
pesadelos...
Doces emoções,
memórias eternizadas no papel!
As palavras ditas cara a cara,
as que não se dizem, apenas se pensam,
as que se escrevem...
Todas elas pontuam momentos,
acentuam emoções,
poetizam realidades,
destroem sensibilidades,
magoam mais do que qualquer dor física
ou, tão simplesmente, acalentam,
amamentam para sempre as nossas fragilidades,
porque o poder das palavras é magnânimo,
mães Universais da glória e da derrota,
do amor e da solidão,
da vida e da morte.
E quão magnânimo é quem as entende!
                                                Célia Gil

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